30 de janeiro de 2009

Ashes To Embers



(foto de Luis Rodrigues)


Nem sempre me incendeia o acordar das ervas e a estrela
despenhada de sua órbita viva.
- Porém, tu sempre me incendeias.

Esqueço o arbusto impregnado de silêncio diurno, a noite
imagem pungente
com seu deus esmagado e ascendido.
- Porém, não te esquecem meus corações de sal e de brandura.

                                                                                                         Herberto Helder
 






26 de janeiro de 2009

Betty Caine




Betty Caine
In her long lost spider garden
And Betty Caine
Knows the steps and secret places
All too bloody well
No, Betty Caine
She won't come out of her haunted hide-out
Not until - not until spring has come
The sunken continents rose
She's gonna make them sink again




 



mp3
 

21 de janeiro de 2009

Uh



Se houvesse degraus na terra...


Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,
eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.
No céu podia tecer uma nuvem toda negra.
E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,
e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.


Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,
levei um lenço à boca e o lenço fez-se vermelho.
Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,
e a fímbria do mar, e o meio do mar,
e vermelhas se volveram as asas da águia
que desceu para beber,
e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.

Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo.
Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.
Correram os rapazes à procura da espada,
e as raparigas correram à procura da mantilha,
e correram, correram as crianças à procura da maçã.



                                                                                            Herberto Helder

 


 

Fósforo

Hoje não há música, poemas ou fotos delico-doces, apenas o que me passou pela cabeça ao ouvir um comunicado num noticiário nacional, Israel pretende terminar os ataques à Palestina depois de 1300 mortos.

Vejo imagens de pessoas em andrajos, no meio de destroços, casas partidas ao meio, pessoas que perderam familiares, pessoas sem assistência médica, sem bens de 1ª necessidade.

Do lado Israelense morreram 10 militares e três civis.

Um homem festeja, ainda não percebi bem o quê, num quase recorde de 10 bailes de gala, com elegância e muito charme.

Festeja a esperança e mudança?
Não vi nada ainda.

Há sete anos várias pessoas estão encarceradas e sentenciadas em Guantanamo.
Por, dizem, actos de terrorismo contra o ocidente.

Já anteriormente tinha dito que não acredito na retaliação, mas por acaso já me explodiram alguém próximo, o meu amor, uma das minhas manas?

Tive alguém da minha família sem medicamentos, água, casa ou a própria liberdade?

Não sei nada disso, não sei se me vestiria de explosivos se me cortassem a vida.
Não sei viver sem os que amo.

16 de janeiro de 2009

Lump Sum



Na descida da rampa os anjos
rodam os saios de lã nas silvas de aço e de esmeralda.
Prados de chamas lavram a colina.
À esquerda o cimo do terreiro é pisado
por todos os homicídios
e todo o fragor de desgraça descreve a sua curva.
Atrás da crista da direita a linha dos orientes,
dos progressos.
E enquanto a faixa superior do quadro é formada
por rumor hiante e turbilhonante
das conchas dos mares e das noites humanas,
A doçura florida das estrelas e do céu e do resto desce
frente à rampa,
como um cesto,
contra a tua face,
e gera o abismo floral e azul lá em baixo.

                                                                                                                           Jean-Arthur Rimbaud



 



 
 

15 de janeiro de 2009

Ash Wednesday

A Implosão da Mentira ou o Episódio do Riocentro

Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.
Mentem, sobretudo, impune/mente.

Não mentem tristes. Alegremente
mentem. Mentem tão nacional/mente
que acham que mentindo história afora
vão enganar a morte eterna/mente.

Mentem. Mentem e calam. Mas suas frases
falam. E desfilam de tal modo nuas
que mesmo um cego pode ver
a verdade em trapos pelas ruas.

Sei que a verdade é difícil
e para alguns é cara e escura.
Mas não se chega à verdade
pela mentira, nem à democracia
pela ditadura.
                                                                                                                  Affonso Romano de Sant'Anna




 
 


 
 

10 de janeiro de 2009

She Rains


 
JERUSALÉM - Ignorando a resolução do Conselho de Segurança da ONU determinando uma trégua imediata da ofensiva militar na Faixa de Gaza, Israel realizou 40 ataques aéreos na madrugada deste sábado contra a Faixa de Gaza, região que vive três semanas seguidas de grande violência. As tropas de infantaria também teriam avançado e trocado tiros com palestinos nas proximidades da Cidade de Gaza, embora aparentemente ainda não tenham entrado nas áreas de maior população.

 
Não houve relatos de lançamento de foguetes palestinos contra Israel durante a madrugada, mas na manhã deste sábado, vários teriam sido lançados e atingido áreas desabitadas (vídeo dos treinamentos do Hamas) .Segundo o Ministério Palestino de Saúde, mais de 800 pessoas foram mortas desde o início da ofensiva em Gaza, mais de 40% deles mulheres e crianças. O governo de Israel diz que 13 cidadãos morreram.
 


 


 
 

8 de janeiro de 2009

Start and Stop Again










Start and Stop Again
É um...
DESLIZAR o tempo sobre o tempo ...
DESCALÇAR os pés sobre um chão mole ...
PROCURAR um fim qualquer ...
DORMIR sobre os diamantes ...
SONHAR com as palavras sem sentido ...
ENCONTRAR um olhar distante com um ouvido atento...
DIZER o que se quer, para que fique dito para sempre...
SABER que ontem já passou e amanhã ainda está para vir...
REPOUSAR sobre a vida das flores e o voo nupcial...
DESCOBRIR que há dois tipos de pessoas, os narcisos e os gladíolos...
ACREDITAR nos buracos de vermes...
ANDAR para que a calma restabeleça a ordem dos sentidos...
TRAZER tudo o que até agora se guardou...
DEVOLVER as cores às noites sem fim...
CORRER com uma mão livre e um livro debaixo do braço...
APRENDER com as crianças que o tempo é subjectivo...
VER a história de cada um de nós esvair-se como se fosse uma ampulheta...
PROCURAR um fim qualquer...
E é também ...
NÃO DESLIZAR o tempo sobre o tempo...
NÃO DESCALÇAR os pés sobre um chão mole...
NÃO PROCURAR um fim qualquer...
NÃO DORMIR sobre os diamantes...
NÃO SONHAR com as palavras sem sentido...
NÃO ENCONTRAR um olhar distante com um ouvido atento ...
NÃO DIZER o que se quer, para que não fique dito para sempre...
NÃO SABER que ontem já passou e que amanhã ainda está para vir...
NÃO REPOUSAR sobre a vida das flores e o voo nupcial...
NÃO DESCOBRIR que há dois tipos de pessoas, os narcisos e os gladíolos...
NÃO ACREDITAR nos buracos de vermes...
NÃO ANDAR para que a calma restabeleça a ordem dos sentidos...
NÃO TRAZER tudo o que até agora se guardou...
NÃO CORRER com uma mão livre e um livro debaixo do braço...
NÃO APRENDER com as crianças que o tempo é subjectivo...
NÃO VER a história de cada um de nós esvair-se como se fosse uma ampulheta...
NÃO PROCURAR um fim qualquer...
CORTAR a meta...
CORRER o risco...
CHEIRAR a coca...
RASGAR a pele...
QUERER amar...
CRIAR o espaço...
VOLTAR a vê-lo
PEDIR de vida...
ESTENDER a mão...
FECHAR os olhos...
TROCAR as voltas...
DIZER que não...
ABRIR a porta...
FICAR sozinho...
SOLTAR o filho...
IR ao acaso...
MATAR o tempo...
LER-lhe nos olhos...
DEIXAR passar..
TER para dizer...
LEVAR consigo...
SABER guardar...
GOSTAR de rir...
PODER fugir...
ESQUECER o fim...
CONTAR a história...
PERDER o rumo...
OUVIR falar...
ACRESCENTAR...
                                                                                                        Olga Roriz

Kiss my Name

Kiss my name
Mama in the afterglow
When the grass is green with grow
And my tears have turned to snow


I’m only a child
Born upon a grave
Dancing through the stations
Calling out my name


Oh mama kiss my name
I am trying to be sane
I’m trying to kiss my friends
And when broken, make amends


Kiss my name, the curtains white
The turtle doves embroider light
As I lie, murdered in ground
The rain compacting sodden sound
Of songs I sang the years before
When it was time to rain
Upon the coal that I became










3 de janeiro de 2009

Dust and Water



Framentos de um Diário

Amo
as águas no instante em que não são do rio
Nem pertencem ainda ao mar.....
.....árduas planícies rosto incendiado pesando-me
nos ombros
hirto....tatuado no entardecer de magoada cocaína.....

.....leio baixinho aquele poema Eu de Belaflor
nocturna sombra de corpo embriagado
fogos por descuido acesos no húmido leito dos juncos...
...altíssima margem....inacessível noite de Florbela

e o soneto dizia: Sou aquela que passa e ninguém vê
sou a que chamam triste sem o ser
sou a que chora sem saber porquê

...apesar de tudo conheço bem este rio
e o cuspo diáfano do coral o sono letárgico
dos reduzidos seres marinhos esmagados
na pressa do mar...possuo este resíduo de vida estelar
gravada na pele está a cabeça de medusa loura....dói
nas comissuras penumbrosas das falésias
que me evocam
os ternos lábios das grandes bocas fluviais.....

...sinto o rigor das plantas erectas as vozes esparsas
os corpos de ouro enleados na violência das maresias....
...junto á foz de meu inseguro desaguar...continuo sentado
escrevo a desordem urgente das horas...medito-me
cuidadosamente o tabaco amargo pressente-te na garganta
e no fundo inóspito do corpo desenvolve-se
o desejo de fugir....
.... espero o cortante sal-gema das ilhas.....a ilusão
conseguir prolongar-me na secreta noite dos peixes....
...adormeço enfim
para que estes dias aconteçam mais lentos
nas proximidades inalteráveis deste mar....
                                                       Al Berto