29 de março de 2009

Prelude For Time Feelers



Quero
escrever o borrão vermelho de sangue
com as gotas e coágulos pingando
de dentro para dentro.
Quero escrever amarelo-ouro
com raios de translucidez.
Que não me entendam
pouco-se-me-dá.
Nada tenho a perder.
Jogo tudo na violência
que sempre me povoou,
o grito áspero e agudo e prolongado,
o grito que eu,
por falso respeito humano,
não dei.

Mas aqui vai o meu berro
me rasgando as profundas entranhas
de onde brota o estertor ambicionado.
Quero abarcar o mundo
com o terremoto causado pelo grito.
O clímax de minha vida será a morte.

Quero escrever noções
sem o uso abusivo da palavra.
Só me resta ficar nua:
nada tenho mais a perder.

Clarice Lispector



8 comentários:

Haddock disse...

belo. e o inspirador contrário: tempo em que a esperança de (na) vida é a morte.

rosa disse...

uma vez imaginei a minha morte.

uma cena assim tipo a trepanaçaõ.

solidão. foi a ideia que ficou.

ze disse...

imaginar a própria morte?
trepanação craniana?
Black and decker?
explica lá isso melhor,
devagarinho...

rosa disse...

ahhh isso agora.

é uma história muito longa.

um "fetish" que tenho, a trepanação.

uma procura de outro nivel de consciencia.

ás vezes quase consigo.

nesse dia consegui imaginar a minha morte. muito forte a sensação.

parvoíces.

ze disse...

Sim, sim,
Parvoíce e das fortes,
Desculpa lá dizê-lo.
Mas não é nada cool pensar na própria morte!

Se por um lado espero que já fosses velhinha nessa visão,
Por outro experimentar trepanações em idades avançadas pode mesmo ser fatal.

A trepanação não faz mais sentido do que o lsd,
Querer o difícil ou impossível através do imediatismo de um carregar de botão.
Talvez em sonhos...

rosa disse...

uma procura de outro nivel de consciencia.

vale sempre a pena quando a ... quê?

Haddock disse...

...

sempre achei a broca demasiadamente introspectiva... só sob o efeito de sinestesia!!

noites brancas... das más (?!)

rosa disse...

ai a sinestesia...